Este é o artigo inaugural de uma série que vou escrever sobre a sociedade portuguesa. Algumas das ideias que vou expor têm anos de maturação (outras têm horas) e talvez possam ajudar alguém numa altura em que parece que este país está à espera não se sabe bem do quê…
Os sindicatos estão a morrer. Foram criados numa altura em que o poder entre patrão e empregado estava bem definido e do lado do patrão. Como consequência da falha de adaptar-se ao mundo actual, de margens mais curtas, grande flexibilidade para os mais jovens, onde o empregado passou de funcionário a colaborador (porque o salário deixou de ser razão suficiente para o trabalho eficaz), os sindicatos encontram-se numa posição perto da irrelevância, porque a maior parte dos sindicalizados são da geração mais velha que se encontra prestes a deixar o mercado de trabalho.
Os sindicatos podem ser úteis nos dias de hoje, embora precisem de mudar a sua lógica. Se o objectivo de um sindicato é garantir o trabalho dos seus membros deve passar para além de dar a conhecer os direitos do trabalho. As formas de lutas também precisam de passar de reivindicativas para formas mais inteligentes.
Assim, o que eu sugiro que um sindicato devia fazer:
- Defesa dos Direitos dos Trabalhadores – esclarecimento aos seus associados de direitos e deveres no trabalho, apoio jurídico. Participação política na revisão de legislação que afecta os seus associados.
- Bolsa de Formação – identificação e criação de planos de formação para os associados, garantindo a sua capacidade de continuar a trabalhar. Isto inclui desenvolver a capacidade de fazer um diagnóstico da empresa para não ser surpreendido numa situação de falha financeira (se um associado identificar os problemas antes de eles se reflectirem no seu salário, a empresa terá maiores probabilidades de continuar em funcionamento, ou o associado de se ir embora antes de ficar com salários em atraso). Também deve existir um foco em gestão de trabalho e do chefe (para o caso deste ser incompetente/desorganizado).
- Outplacement – apoio a recolocação de associados. Um sindicato tem contactos em várias empresas e pode mais facilmente colocar alguém do que qualquer agente externo ou mesmo os RH da empresa. Em ligação com a bolsa de formação e um conhecimento . Numa situação de falência de uma empresa este papel provavelmente provocaria não só um assegurar dos associados, como um nível de gratidão a nível pessoal difícil de ser eliminado.
- Wikileaks interno – o sindicato, não respondendo à empresa, pode servir de ponto de comunicação entre a gestão de topo da empresa e os seus associados, reduzindo o risco destes serem despedidos e garantindo que a informação chega a quem pode agir antes de ter efeitos que possam, em último caso, resultar no despedimento de grande parte ou mesmo a totalidade da força de trabalho.
- Informação sobre o mercado – nos mercados em que actua o sindicato deve conseguir fornecer informação sobre as empresas e os seus principais desafios aos seus associados, promovendo assim a segurança que tem quem sabe o que se passa (versus o ser surpreendido com uma alteração no seu mercado específico).
Isto implica um refazer da estrutura sindical, uma vez que o sindicato funcional/vertical é praticamente inútil nesta estrutura. Justifica-se a sua existência para a função de “Informação sobre o mercado”, mas pouco mais. Os associados de um sindicato, cada vez menos, passam a sua vida num único mercado/indústria. E, mesmo nesses casos, raramente têm sempre o mesmo tipo de funções. É a essa realidade que até agora os sindicatos portugueses não se conseguiram ajustar. Espero que saibam fazê-lo.
Tenho estado para comentar este post…
Quanto aos primeiros pontos, não podia estar mais de acordo. Só estranho é se os sindicatos ainda não fazem isso.
A respeito do wiki é que já não ponho as mãos no fogo. Como é que podemos ter a certeza de que não ia ser mal usado?
Se por outro lado colocarmos a importância de incentivar a transparência das empresas, então estou de acordo.
A proposta não era de um wiki, mas de um sistema de informação que dê confiança ao empregado e faça a informação chegar onde pode ser útil (a gestão da empresa). Sei de pelo menos uma situação em que um sindicato fez esse papel, com ganhos para todos os intervenientes.